Inutil Paisagem

Inútil paisagem


Vi uma paisagem dessas na tela do cinema ontem, arrebatadora, mas pedi licença a mim e pedi que me acalmasse.

Lembrei que todos me disseram que eu precisava me desapegar e que eu tinha pensado também em colocar minha cabeça em outro lugar. Deixei os frames passando nessa narrativa e as cores perderam todo o sentido. Aquele amarelo de gema de ovo, que o sol deixou escorrer sobre aquele cais onde o personagem andava. O azul do mar transformado em prateado pela luz intensa de Cabo-Verde. O momento em que ele parte para descobrir seu destino e sua identidade, como em outros filmes do Fernado Vendrell, um gajo muito do caraças.

Em vez de mergulhar no sonho da tela e da sala escura, como até Kubrick dizia, eu me vi sozinho em uma sala grande e escura, com cadeiras vermelhas como o inferno, sentindo um frio do caramba por causa do ar-condicionado, em uma cidade esquisita, olhando uma tela com uma só fatia de luz que mostrava uma outra vida interessante o bastante para ser filmada, editada e exibida.

Não chegou a ficar cinza para mim, o que ainda seria esperado e charmoso, mas as cores continuaram ali sem sentido nenhum, nem o contraste que o preto e branco poderia dar.

Queria não ter sombra.